Entrevista com Dr Juarez Monteiro Molinari 05/03/2020 - 11:54

Vivemos uma epidemia de mortes e lesões causadas por acidentes de tráfego. No mundo, essas lesões representam a principal causa de morte entre crianças de 5 a 14 anos e também entre os jovens dos 15 aos 29 anos. Tem-se um total de um milhão, trezentos e cinquenta mil pessoas que perdem a vida a cada ano por este motivo, o que levou a Assembleia Geral das Nações Unidas a declarar a década de 2011/2020 como a década de ações para a segurança de trânsito. No Brasil, a ONU estima que ocorram 41.000 mortes decorrentes relacionadas a acidentes de trânsito, motivo que levou o país a elaborar o Pacto Nacional para Redução de Acidentes. O país tem avançado para reduzir estes números e a Associação Brasileira de Medicina do Tráfego tem colaborado neste sentido. Além de contribuir na devida formação de nossos especialistas, a ABRAMET submete os médicos a provas de titulação como qualquer outra especialidade médica. Elaborou ainda a lei das cadeirinhas, da alcoolemia zero e tantas outras diretrizes. Entretanto, a especialidade está ameaçada a deixar seu papel de protagonista, para ser mera espectadora nas avaliações dos nossos condutores e candidatos a condutores.

Revista Saúde e Trânsito:  Qual sua história na medicina do tráfego?

Dr Juarez Monteiro Molinari: Primeiramente gostaria de cumprimentar à Direção da Revista Saúde e Trânsito por este importante trabalho. Exerço a especialidade de Medicina de Trafego há mais de 25 anos, tendo trabalhado em CFC e hoje faço parte da Junta Médica Especial do DETRAN/RS. Tenho a honra de ser membro da Câmara Técnica de Medicina de Trafego do CFM, Conselho Federal de Medicina, e da Câmara Técnica de Medicina de Trafego do CREMERS, Conselho Regional de Medicina do estado do Rio Grande do Sul. Entre as minhas atividades associativas como especialista em Medicina de Trafego já fui Vice-Presidente da ABRAMET RS e da ABRAMET Nacional, tendo nestes últimos três anos exercido a função de Presidente da ABRAMET NACIONAL.

Revista Saúde e Trânsito: Por que o exame de aptidão física e mental para motoristas deve ser feito por um perito e por que o médico do tráfego?

Dr Juarez Monteiro Molinari: Entendo e defendo que na Medicina deve ser dada prioridade ao colega que tenha formação específica na área que desempenha, e com isto possa exercer com segurança e conhecimento. Você leva o seu filho para consultar com o especialista em Pediatria, seu pai a consultar com o especialista em Geriatria, na Medicina de Trafego não se deve fugir da regra. Todo o colega deve ser especialista. Nestes três anos de Presidente da ABRAMET, procurei valorizar o colega que exerce esta atividade, visitando todos os cantos do país, oportunizando através de Cursos, Jornadas e Congressos para que todos se atualizassem e se especializassem com a realização de Prova específica aos que ainda não eram portadores do título de especialista, devidamente reconhecida pelo CFM e pela AMB. Nosso trabalho deve ser considerado como pericia, de grande responsabilidade. O exame de aptidão física e mental deve ser realizado adequadamente. Nós médicos e psicólogos, como especialistas em Medicina e ou Psicologia de Trafego, somos os responsáveis pela CNH, o condutor recebe a CNH somente após a avaliação específica. Muitas vezes durante cinco anos o condutor não passa por neurologista, cardiologista, endocrinologista e tantas outras especialidades, mas passa pelo Médico de Trafego, a quem cabe, após o EAFM bem-feito detectar alguma patologia que, se não tratada, facilitará a ser causa de acidente de trânsito. Para realizar o EAFM não basta somente ter o Diploma de Médico, tem que ter conhecimento profundo na área de Medicina de Trafego e na legislação ligada ao trânsito, caso não for desta forma, poderá se tornar um caos o trânsito brasileiro.

Revista Saúde e Trânsito: Estamos sendo relevantes em nossa atuação profissional? Como valorizar a medicina do tráfego perante a sociedade?

Dr Juarez Monteiro Molinari: Creio que já respondi parte na pergunta anterior: ser especialista e realizar adequadamente e com muita responsabilidade o Exame de Aptidão Física e Mental. A Medicina de Trafego é uma especialidade muito importante e deve ser cada vez mais valorizada. Não devemos esquecer que, lamentavelmente, o Brasil ainda se destaca entre os principais países em que o acidente de trânsito com morte tem alta incidência, não conseguindo chegar perto do proposto pela OMS. Cabe muito a nós Médicos de Trafego auxiliar, através de EAFM bem feito, para a diminuição deste índice alarmante e preocupante. Temos cerca de oito estados brasileiros em que o índice de acidente de trânsito é maior do que o índice de homicídios.

Revista Saúde e Trânsito: Temos dificuldade em encontrar dados científicos brasileiros relacionados à medicina de tráfego. Além do importante papel de julgador do médico do tráfego, como estimular os colegas a produzirem cientificamente?

Dr Juarez Monteiro Molinari: A ABRAMET tem a sua revista científica, produzida semestralmente; além da elaboração a cada três anos do ATLAS, aonde consta e atualiza as estatísticas sobre tudo relacionado com o trânsito, em especial o acidente; cuja distribuição tem sido destinada aos órgãos governamentais e entidades científicas. Possuímos convênios com diversas universidades tais como em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Sempre convidamos a todos os colegas para enviarem as suas experiências e acessarem ao site da ABRAMET visando cada vez mais discutirmos o trânsito e a especialidade. Mensalmente são elaboradas aulas pelo EAD que ficam à disposição do colega associado. Hoje a ABRAMET tem residência médica em São Paulo e no Rio de Janeiro com a perspectiva de expandir para outros estados. Vários livros são editados por colegas e professores de Medicina de Trafego. Creio que cada colega deve procurar se socorrer do que a ABRAMET possui, se associando a mesma, procurando se inteirar das diversas Diretrizes elaboradas pela entidade e reconhecidas tanto pela AMB como pelo CFM.

Revista Saúde e Trânsito: Como melhorar a interação entre a medicina e a psicologia do tráfego?

Dr Juarez Monteiro Molinari: Nestes três anos na presidência da ABRAMET procuramos, intensamente, a aproximação e parceria com a ABRAPSIT a nível nacional. Em todas as Jornadas e Congressos procuramos trazer o maior número possível de Psicólogos que atuam no trânsito brasileiro; entendo como altamente positivo. No Paraná, quando realizada a Jornada em Maringá, teve a participação efetiva de muitos Psicólogos sob a liderança da ABRAPSIT. São duas áreas importantes para o trânsito de que necessitam ser valorizadas.

Revista Saúde e Trânsito: Quais as ações da ABRAMET nacional frente o PL 3267?

Dr Juarez Monteiro Molinari: Desde que o senhor Presidente da República, ainda não empossado (28/12/18) noticiou do interesse em alterar o CTB procuramos interceder com a segurança de que seria um Projeto com muitas falhas e nada traria de melhor para o trânsito. Uma longa história que não caberia relatar tudo nesta entrevista. A partir do momento em que o foi entregue o PL na Câmara de Deputados fizemos quase que um acampamento naquela Casa. Conversando pessoalmente com o Presidente da Câmara, Deputado Rodrigo Maia, com a maioria dos Senhores Deputados, com todos os membros da Comissão Especial que está analisando o PL 3267/19, com o Presidente e Relator da referida Comissão, audiências com diversos Ministros de Estado, procurando demonstrar que o PL entre tantas alterações teria como finalidade exterminar a Medicina de Trafego. Quase a totalidade dos que nos receberam foram e continuam sensíveis às argumentações da ABRAMET, apresentamos dados científicos e várias diretrizes já elaboradas nestes últimos quarenta anis pela nossa entidade, participando inclusive de uma audiência pública da Comissão Especial contando com o grande conhecimento e apresentação feita pelo nosso mestre Dr. Flávio Emir Adura. O relatório elaborado pelo Deputado Federal Juscelino Filho, Médico, sobre o PL 367/19 está sendo considerado satisfatório pela ABRAMET, e deverá ser apreciado e votado pela Comissão Especial no mês de fevereiro de 2020. Destaco a atenção e sensibilidade do Deputado Juscelino Filho, bem como sua assessoria aos argumentos que lhes apresentamos por diversas vezes.

Revista Saúde e Trânsito: A ABRAMET "aceitou" a proposta dos 10 anos?

Dr Juarez Monteiro Molinari: Tem um ditado, aqui no sul, que diz que se percam os anéis mas que fiquem os dedos. Lamentavelmente tudo o que propusemos e argumentamos não se conseguiu colocar. Não aceitamos a proposta dos dez anos, ficou muito claro, mas se não cedermos alguma coisa perderemos tudo. Demos prioridade para que constasse no caput de que caberia somente ao especialista em Medicina de Trafego fazer o EAFM, contrariando claramente ao que consta no PL 3267, que abriria para que o EAFM pudesse ser feito por qualquer médico do SUS sem necessidade de ser Médico do Trafego, o que terminaria com a nossa especialidade. Com relação ao tempo de intervalo dos EAFM sempre caberá, apesar da legislação, ao Médico ou Psicólogo definir se aquele condutor portador de certa patologia poderá aguardar dez anos ou ter de ser reexaminado em 1, 3, 5 anos, etc.

Revista Saúde e Trânsito: Qual o futuro da medicina de tráfego?

Dr Juarez Monteiro Molinari: O futuro da Medicina de Trafego depende quase que exclusivamente de nós. Precisamos estar sempre atualizados e realizar exames adequadamente e com seriedade. Precisamos ter nossas entidades tanto a nível nacional como estadual fortes e unidas. Sem uma ABRAMET forte e representativa não conseguiremos a valorização que tanto almejamos.

Revista Saúde e Trânsito: Sabemos que o Sr esteve a frente da ABRAMET Nacional até dezembro de 2019. Faça um breve balanço da sua gestão como presidente nacional da ABRAMET.

Dr Juarez Monteiro Molinari: Foi uma experiência enorme. Valeu pelos amigos que conquistei neste Brasil todo, principalmente os colegas que atuam na Medicina de Trafego. Creio que conseguimos algumas vitórias como: criação de mais Federadas, de várias Camarás Técnicas em diversos CRM e no próprio Conselho Federal de Medicina, Comissão de Violência no Trânsito na Associação Médica Brasileira, relacionamento institucional com todas as Federadas da AMB, BOM RELACIONAMENTO COM OS GOVERNOS DE Estados e Nacional tendo a Medicina de trafego como o nosso Partido, relacionamento com entidades internacionais na área do trânsito, realização de diversas Jornadas em todos os cantos do país, e para concluir a realização do Congresso de Medicina de Trafego em Brasília que contou pela primeira vez com a participação de todos os DETRAN, através da AND Associação nacional dos DETRAN, e com todos os CETRAN através do FOCOTRAN, além da ABRAPSIT. Entregamos com situação financeira e números de sócios maior do que quando recebemos. Enfim deixamos a ABRAMET pronta para seguir seus passos com segurança e tranquilidade. Meu agradecimento especial a Deus, a minha família através da minha querida esposa Mara, e a todos os queridos colegas e amigos que confiaram em mim e muito me ajudaram.

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